Freud estava tranquilo em seu consultório, eis que de repente surge uma senhora de aproximadamente quarenta e poucos anos acompanhada de uma amiga. Ela estava muito angustiada e foi lá contar sua história ao doutor.
“Freud, estou muito angustiada. Meu marido me largou e desde então me sinto assim. Fui em outro médico, ali próximo à Viena e falei que não estou nada bem. Sabe o que ele me disse?” Freud deu uma baforada em seu charuto e respondeu: “Hum”. “Ele falou que preciso transar, que meu problema é falta de sexo. Tu acredita na ousadia do maluco? E disse mais, falou que eu tinha três opções: ou voltava pro traste do meu marido, ou arranjava um amante bem-dotado (pra saciar meu fogo), ou me acabava na siririca de tanto gozar”, a jovem senhora continuou: “E ele ainda falou que aprendeu tudo isso com o senhor, que era para eu vir aqui tirar satisfações contigo”. “Oxi, lá ele.”, respondeu Freud com o seu típico sotaque baiano.
O relato acima, feito de forma caricata e linguagem popular, é verdadeiro em essência e pode ser encontrado no texto “Sobre Psicanálise Selvagem (1910)” de Sigmund Freud. Ele diz o seguinte: “...se um médico acha necessário discutir o tema da sexualidade com uma mulher, tem de fazê-lo com tato e discrição.” (aqui temos palavras do pai da psicanálise).
Recém formados em psicologia ou psicanálise podem ficar mordidos para entregar logo ao paciente suas conclusões, muitas vezes com boas intenções, acreditando que farão bem a ele caso apresente seus “conteúdos desconhecidos”. É fato que em dado momento deverá ser feita uma interpretação, porém, quando isso será melhor recebido pelo paciente? Freud explica. Ele afirma que essas comunicações — interpretações do terapeuta — devem ser apresentadas aos pacientes após duas condições estarem bem estabelecidas. Primeira condição: é necessário que o próprio paciente tome consciência daquilo que reprimiu. Segunda condição: a relação do paciente com o terapeuta (transferência) deve ser forte o suficiente para que o primeiro não fuja, quando ficar ciente dos seus conteúdos inconscientes.
Ademais, Freud nos diz: “O fator patogênico não é a ignorância em si, mas o fato de ela se fundamentar em resistências internas, que inicialmente a provocaram e ainda a sustentam. A tarefa da terapia é combater essas resistências.” E ele continua, dizendo que informar ao doente acerca dos seus conteúdos inconscientes ajuda muito pouco; segundo palavras dele: “Mas essas medidas têm tão pouca influência nos sintomas da doença nervosa quanto a distribuição de cardápios para os famintos numa época de fome.” Percebemos que a interpretação dos conteúdos inconscientes dos pacientes sozinha não promove mudanças significativas. É importante ir mais fundo e encontrar as resistências internas, que levaram (e ainda levam) o paciente a reprimir tais questões.
Citemos um exemplo para fins didáticos: talvez o psicólogo ou psicanalista tenha encontrado elementos que indiquem que o paciente reprimiu fortes desejos homossexuais. Se ele simplesmente disser: “Olha, após a análise de diversos elementos que me trouxe, creio que você gosta mesmo é de homem e que tem uma homossexualidade latente.” É muito fácil perceber que tal interpretação — por mais verossímil que seja — despertará um enorme constrangimento ou raiva no paciente. “O quê? Você tá me chamando de enrustido?!” poderá dizer o paciente ofendido. Este é um claro exemplo de falta de tato e discrição. A entrega destes conteúdos, desta forma, bem provavelmente levarão o paciente a piora do quadro, aumentando sua angústia. Mas, como falar sobre isso com ele?
Não fale, vá a fundo na análise, com perguntas, deixe que ele mesmo encontre as causas da sua angústia e suas resistências internas. Lembre-se da frase acima de Freud: “A tarefa da terapia é combater essas resistências”; se o próprio paciente chegar às conclusões dos motivos que o levaram a reprimir seus desejos e emoções, poderá agir sobre isso, de tal forma a produzir o alívio da angústia que experimenta. Não é entregando tudo facilmente de bandeja que ele irá melhorar. As coisas — segundo Freud — não funcionam assim.
Sigmund Freud aconselha a todos os médicos que atuem com tato e discrição para evitar o agravamento do sofrimento dos pacientes. É importante lembrarmo-nos que devemos ser humanos antes de sermos terapeutas.
Obrigado pela leitura. Um forte abraço 🫂.
— Alessander Raker Stehling
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