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Foto do escritorAlessander Raker Stehling

Freud, Psicanálise e Negação: O Papel dos Mecanismos de Defesa nos Relacionamentos

Ontem eu me senti em uma cena daquelas séries policiais. Do nada, ouço sons de sirene e uma voz do lado de fora, gritando: “Larga a faca e coloca as mãos na cabeça!” Confesso que, com certo medo, mas muita curiosidade, corri para a fresta do portão. Espiei e vi três viaturas na porta da Dona Eunice, a vizinha da minha avó. A coisa estava feia. Quando, de repente, sinto uma mão nas minhas costas, dei um pulo de susto — era minha tia, que já foi dizendo: “Sai daí! Entra logo. Isso aí não vai dar em nada. O marido da Dona Eunice vai pra delegacia, ela vai junto e, daqui a pouco, estão de volta, como sempre. Você sabe como é... Quando a gente pergunta dos hematomas, ela sempre diz: ‘Não posso dizer que meu marido é ruim comigo. Ele tem um lado muito bom também.’”


Essa frase da minha tia me lembrou o texto “Negação”, de Freud, escrito em 1924. Naquele texto, ele explicou uma coisa brilhante: através da negação, a gente dá um jeitinho de tomar consciência daquilo que foi reprimido, mas sem entrar em contato direto com nossos verdadeiros sentimentos.


Pensa só na Dona Eunice. Quando ela diz “Não posso dizer que meu marido é ruim comigo,” ela está, na verdade, justamente dizendo que ele é ruim. A negação está fazendo o papel de um escudo. Ela evita que todo aquele sentimento de dor e impotência chegue à consciência de uma vez só. Afinal, se o marido dela fosse mesmo tão bom assim, ela não começaria a frase com um “não”. Ela já teria uma lista pronta para falar bem dele. Mas não. Ela já inicia o discurso com uma negação, e Freud percebeu isso muito bem em seus diversos pacientes.



Se a Dona Eunice conseguisse encarar a realidade, talvez ela dissesse algo como: “Sim, meu marido é ruim comigo. Ele me machuca, mas eu preciso dele. Tenho medo de ficar sozinha, dependo dele financeiramente, emocionalmente...” Mas encarar tudo isso é duro demais para ela, imagino eu.


Agora, olha bem ao seu redor. A história da Eunice não é uma exceção, não. Tem muita gente por aí usando o mesmo mecanismo. É o amigo que diz “Ah, eu não bebo tanto assim,” enquanto pega o copo com a quinta dose da noite. Ou aquela pessoa que fala “Não estou chateada, nem ligo mais para isso,” com uma cara de quem está a ponto de explodir de raiva. São negações que servem para proteger, para não ter que encarar o problema de frente. Porque, às vezes, aceitar a realidade dói mais do que fingir que está tudo bem.


Freud entendeu que essa estratégia inconsciente nos mantém num ciclo, rodando em círculos, evitando a dor do confronto. Mas a realidade sempre volta, e quanto mais tempo passamos negando, mais emoções negativas vamos represando — e o resultado, todos sabemos.


Dona Eunice, como tantos outros, é prisioneira do próprio medo. E quem nunca fez o mesmo? Quem nunca olhou para uma situação difícil e escolheu varrer para debaixo do tapete? O problema é que, um dia, esse tapete fica tão cheio que tropeçamos nele.


Guimarães Rosa dizia que o que a vida quer da gente é coragem. E ele está certo. Coragem para encarar as feridas, os traumas e os medos. Coragem para parar de se esconder atrás da negação. Porque só quando aceitamos a verdade, com toda a dor e desconforto que ela traz, é que conseguimos nos libertar de verdade. Não é o “não” que vai nos salvar, mas a coragem de dizer “sim” — sim ao que é, ao que dói, e, principalmente, ao que podemos ser quando paramos de fugir.


Então, eu te pergunto: até quando você vai continuar fingindo que está tudo bem?


— Alessander Raker Stehling

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“A negação é um modo de tomar conhecimento daquilo que foi recalcado.”  Frases Freud
“A negação é um modo de tomar conhecimento daquilo que foi recalcado.” Frases Freud

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